segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Palácio da Liberdade


Quem passa pela charmosa Praça da Liberdade nem imagina que o lugar passou por uma grande transformação no início do século XX. As formas arredondadas, desenhadas pelo paisagista Paul Villon, de estilo inglês, e que surgiram junto com a capital, foram alteradas pelo atual formato geométrico e retilíneo, da arquitetura francesa. O resultado deu ares parisienses, inspirados nos emblemáticos jardins de Versalhes, em Paris.

O motivo da mudança foi nobre. Em 1920, os reis belgas Elizabeth e Alberto I estavam a caminho da cidade e o desejo do então presidente do estado de Minas Gerais, Arthur Bernardes, era de que os monarcas se sentissem em casa, já que na Bélgica, a influência francesa sempre foi muito forte. Sua ordem, então, foi alterar tudo. Mais de 90 anos se passaram, a cidade cresceu, mas as mudanças motivadas pela visita real foram preservadas. [...]

A  vinda da realeza foi um grande acontecimento no país, já que era a primeira vez que o Brasil, como república, recebia representantes de uma monarquia europeia. No dia 2 de outubro de 1920, acompanhados do presidente da república Epitácio Pessoa, os reis belgas desembarcaram na Praça da Estação, em BH, em vagões fabricados especialmente para os ilustres turistas. Muitos belo-horizontinos foram à estação de trem ver de perto e, pela primeira vez, representantes de uma realeza.

De lá, o casal real seguiu em carruagem para o Palácio da Liberdade, também minuciosamente adaptado para agradar aos reis. 




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O imóvel, símbolo máximo do poder mineiro, ganhou mobília no estilo Luis XV, que ainda pode ser apreciada no salão nobre do prédio histórico. 





O quarto do governador, porém, foi o cômodo que recebeu mudanças mais significativas. "O quarto era bem mais simples. Do Rio de Janeiro, vieram artigos no estilo Luis XVI e com detalhes em rococó, folheados à ouro", conta Bruno Mitre, curador do Palácio da Liberdade, que é aberto à visitação pública aos sábados, domingos e feriados. 




O presidente do estado, Arthur Bernardes, como bom anfitrião, cedeu o quarto do palácio para o rei e a rainha belga. No entanto, ele não ficou muito longe dos monarcas, já que se hospedou no Solar Narbona, oferecido pela família detentora do imóvel – e que dá nome a ele –, que fica bem ao lado, na avenida Cristovão Colombo.

Em agradecimento à boa recepção que tiveram, os reis presentearam o político mineiro com um casal de cisnes negros. Essa atitude agradou ao presidente do estado, e se tornou uma tradição, já que os governadores que o sucederam mantiveram a presença dessa espécie de ave no lago, nos fundos do palácio, até hoje.



Foram apenas dois dias de estadia, contudo, os monarcas gostaram da recepção. A rainha Elizabeth adotou uma pequena sala no segundo andar do palácio, onde gostava de saborear seu chá. Essa atitude levou o governo do estado a batizar o espaço como Sala da Rainha. 



A professora de filosofia da PUC-Minas, Maria de Lourdes Gouveia, autora do livro O Palácio como Símbolo da Cidade – A Matéria da Memória, de 2009, conhece cada pedaço do imóvel mais representativo do governo mineiro, e reconhece a influência e a importância da visita real para o lugar: "A mobília foi trocada pelo estilo francês, pois esse era o modelo vigente no imaginário belga".




A presença de reis na cidade aguçou a curiosidade de muita gente. O poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade, ainda com 17 anos, escreveu os versos intitulados A Visita do Rei: "Vejo o rei passar na avenida Afonso Pena/onde só passam dia e noite, mês a mês e ano, burocratas, estudantes, pés-rapados/Primeiro rei entre renques de fícus e aplausos,/primeiro rei (verei outros?) na minha vida./Não tem coroa de rei, barbas formidáveis/de rei, armadura de rei, resplandescente ao sol da Serra do Curral./É um senhor alto, formal, de meia-idade,/metido em uniforme belga,/ao lado de outro senhor de pince-nez,/que conheço de retrato: o presidente do estado/Não vem na carruagem de ouro e rubis das estampas./Vem no carro da Daumont de dois cocheiros/e quatro cavalinhos mineiros bem tratados"




O menu servido para os reis belgas no belo salão do banquete no Palácio da Liberdade tinha opções como consommé de creme de bruxelles (creme de couve), médaillons de turbot a l’ ostensdaise (peixe), noisettes de pauillac a L’écossaise (batatas), saladas, chá, café e vinhos.





A visita dos reis belgas não tinha o propósito apenas de conhecer a novíssima capital mineira. A ideia era estreitar a relação econômica com o país europeu. Tanto que, no ano seguinte, foi fundada em Sabará a Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira, hoje, Arcelor Mittal

Rafael Campos, 30/05/2014
http://sites.uai.com.br/app/noticia/encontrobh/atualidades/2014/05/30/noticia_atualidades,148855/as-vesperas-do-mundial-da-fifa-saiba-porque-bh-esta-ligada-a-belgica.shtml






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