sábado, 21 de setembro de 2019

Imigrantes no Brasil do século XIX - Império

É significativo o testemunho de um observador norte-americano, R. Cleary, que, durante os últimos vinte e poucos anos da monarquia brasileira, exerceu sua profissão de médico em Lajes, Santa Catarina, tendo imigrado em conseqüência da Guerra de Secessão nos Estados Unidos. Em obra ainda inédita, cujos manuscritos se encontram na Library of Congress, em Washington, oferece Cleary o seguinte depoimento acerca dos colonos alemães em São Leopoldo que, afirma, nada trouxeram de novo ao país adotivo e se limitaram a plantar o que os brasileiros já plantavam e do mesmo modo, primitivo e grosseiro:

Conheci um irlandês em Porto Alegre [...] que tentou introduzir o uso geral do arado entre os alemães. Não obteve o menor resultado, pois os colonos preferiam recorrer a enxadas ou pás e, na grande maioria dos casos, a simples cavadeiras de pau, com o que abriam covas para as sementes. Este último pormenor requer explicação: nossos próprios trabalhadores rurais ficarão sem dúvida estarrecidos se eu lhes disser que a lavoura aqui é feita, em geral, com o auxílio de enxadas, mais raramente de pás — e isso mesmo onde o lavrador é suficientemente esclarecido para resistir ao hábito corrente, que consiste em fazer abrir as covas com auxílio de um simples pedaço de pau, a fim de nelas se colocarem as sementes. É verdade, como acima se disse, que alguns, muito poucos, se socorrem de pás; estas, porém, não passam de pobres sucedâneos para o grande símbolo da civilização, a última palavra de Tubalcain (o salvador do mundo) que é o arado.

 Crônicas lajianas, or a Record of facts and observations on manners and customs in South Brazil, extracted from notes taken on the spot, during a period of more than twenty years, by R. Cleary A. M. ... M. D., Lajes, 1886. Ms. da Library of Congress, Washington, d c , fl. 5 s.; dr. Hans Porzelt, op. cit., p. 23 n. 

[...]


Além de prejudicar a fertilidade do solo, as queimadas, destruindo facilmente grandes áreas de vegetação natural, trariam outras desvantagens, como a de retirar aos pássaros a possibilidade de construírem seus ninhos. “ E o desaparecimento dos pássaros acarreta o desaparecimento de um importante fator de extermínio de pragas de toda espécie. O fato é que, nas diversas regiões onde houve grande destruição de florestas, a broca invade as plantações de mate e penetra até à medula nos troncos e galhos, condenando os arbustos a morte certa. As próprias lagartas multiplicam-se consideravelmente com a diminuição das matas.” Seja como for, os colonos alemães, que há sessenta anos empregaram recursos menos devastadores do que as queimadas, tiveram de acomodar-se, finalmente, ao tradicional sistema brasileiro, pois — diz um depoimento da época — revolvendo-se o solo para arrancar as raízes, sobem à superfície corpúsculos minerais que entravam o crescimento das plantas. 

Sérgio Buarque de Holanda, "Raízes do brasil" (1936).
Da edição Companhia das Letras (1995: 66-68)

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